No sistema anterior à reforma, com a divisão de poderes entre os tribunais superiores e os tribunais de primeira instância, os tribunais administrativos superiores julgavam frequentemente casos em primeira instância, sendo as matérias em discussão atribuídas de acordo com a parte contra quem era proposta a acção, não sendo tida em conta a sua importância ou relevância legal. Assim, o Supremo Tribunal Administrativo (STA) e o Tribunal Central Administrativo (TCA) não actuavam como verdadeiros tribunais de recurso.
Por outro lado, a necessidade de recorrer aos referidos tribunais, ambos em Lisboa, apresentava-se como uma fraca solução tendo em conta necessidade de assegurar a proximidade dos cidadãos com a Justiça. Por forma a prevenir tais inconvenientes, foi escolhido um novo modelo, no qual os tribunais administrativos são agora tribunais administrativos de círculo na maioria dos casos (art. 44.º, n.º 1 ETAF). O STA e o TCA não funcionam agora como tribunais de primeira instância, tendo assim os poderes próprios dos tribunais superiores, à semelhança dos tribunais de recurso na jurisdição comum. Como tal, os TCA são agora, por norma, os tribunais para onde deve haver recurso das decisões tomadas em primeira instância, ou seja, nos tribunais administrativos de círculo (art. 37.º ETAF).
O STA tem o lugar mais elevado na hierarquia, tendo o poder para apreciar questões de relevância social e legal, nomeadamente:
- os recursos para uniformização de jurisprudência (art. 25.º, n.º 1, al. b) ETAF e art. 152.º CPTA);
- os recursos para revista da decisão tomada no TCA, sempre que a matéria em causa seja fundamental, seja pela sua relevância legal ou social, ou sempre que a admissão do recurso seja necessária para uma melhor aplicação da lei;
- os recursos per saltum de revista de decisões dos tribunais administrativos de círculo, sempre que o valor da causa seja superior a três milhões de euros e se apenas questões de direito foram suscitadas nas alegações das partes (art. 24.º, n.º 2 ETAF e art. 151.º CPTA);
- o reenvio prejudicial de casos pendentes em tribunais administrativos de círculo, sempre que uma nova questão de direito seja posta perante os tribunais, levante sérias dificuldades e possa vir a surgir noutros litígios (art. 25.º, n.º 2 ETAF e art. 93.º CPTA);
- os conflitos de jurisdição entre tribunais administrativos e fiscais (art. 24.º, n.º 1, al. h) ETAF e art. 135.º e ss. CPTA).
No que diz respeito a novos casos em primeira instância, estabelece o CPTA no seu art. 16.º e ss., os critérios de jurisdição que, clara e objectivamente, fixam o tribunal competente. O novo sistema introduz inovações também ao nível da alçada, relevante para a admissibilidade do recurso (art. 6.º ETAF e art. 142.º, n.º 1 CPTA), bem como para a determinação do valor da causa (art. 31.º a 34.º CPTA) e da forma do processo (ordinário, sumário ou sumaríssimo — art. 35.º e art. 43.º CPTA).
Estas regras são ainda importantes para determinar se, no âmbito da acção administrativa especial, o caso deva ser julgado por um tribunal singular ou em formação de três juízes (art. 31.º, n.º 2, al. b) CPTA).
Na realidade, as novas regras para a divisão de poderes entre os tribunais administrativos resultaram num alargamento significativo dos poderes dos tribunais administrativos de círculo, o que levou a mudanças no número de juízes necessários para a realização de julgamentos nesses mesmos tribunais. Como tal, a regra alterou-se, para a realização de julgamentos por um grupo de três juízes em vez de apenas um, sempre que estejamos perante uma acção administrativa especial ou quando o valor da causa seja superior ao da alçada do tribunal (art. 31.º, n.º 2, al. b) CPTA e art. 40.º, n.º 3 ETAF).
Nas acções administrativas comuns, o grupo de três juízes julgará apenas se qualquer uma das partes o requerer e desde que nenhuma delas requeira a gravação da prova (art. 40, n.º 2 ETAF).
Ademais, nos tribunais administrativos de círculo, os julgamentos poderão decorrer com a intervenção de todos os juízes do tribunal, sempre que o Juiz Presidente assim o determine, quando o tribunal se deparar com uma questão de direito nova que suscite dificuldades e possa vir a ser suscitada noutros litígios (art. 93.º, n.º 1 CPTA).
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