domingo, 8 de maio de 2011

A natureza jurídica dos planos urbanísticos

O plano urbanístico, enquanto instrumento jurídico emanado pela administração, estará incluído no âmbito da jurisdição administrativa. Sendo isto claro, não se pode dizer propriamente o mesmo a propósito do meio de impugnação contenciosa que deve ser aplicado quando se trata de um plano urbanístico.
Explicando melhor, a natureza jurídica dos planos urbanísticos é objecto de discórdia, havendo quem considere que se trata de um regulamento administrativo e, como tal, aplicar-se-á o regime dos artigos 72.º e seguintes do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), enquanto que, se for entendido o contrário, aplicar-se-á o procedimento previsto para os actos administrativos, constante dos artigos 50 e seguintes do CPTA.
Para se determinar a natureza jurídica do plano urbanístico há que apurar se este tem como características próprias a generalidade e a abstracção, que definem os regulamentos.
Entendendo-se que o plano urbanístico não tem nenhuma das referidas características, uma vez que este se dirige a um conjunto individualizado de pessoas, ou seja, aos titulares de direitos reais sobre determinados imóveis, assim como regula um conjunto de situações concretas, na medida em que todas elas são relativas a específicos bens imóveis, o plano urbanístico reconduzir-se-á a um acto administrativo, aplicando-se o regime dos artigos 51.º e seguintes do CPTA.
O Professor Doutor Alves Correia entende tratar-se de um acto administrativo geral, pois apoia a definição do plano urbanístico como tendo um carácter concreto, como foi apontado acima, mas considera que os destinatários não constituem um grupo determinável, pois é impossível prever-se para o futuro quem serão todos aqueles que virão a ter direitos reais sobre os imóveis em causa.
A posição maioritária na doutrina, na qual se inclui os Professores Doutores Luís Pereira Coutinho e Vasco Pereira da Silva, entre outros(1), funda-se no facto de que, além de o plano urbanístico ser abstracto, como acontece na última posição enunciada, este também apresenta um carácter geral, pois aplica-se a toda e qualquer operação urbanística cuja execução se venha a questionar no futuro a propósito do imóvel em causa. Assim, aplicar-se-á o procedimento previsto nos artigos 72.º e seguintes do CPTA.
Todavia, partindo do pressuposto enunciado pelo Professor Doutor Vasco Pereira da Silva de que se encontram abrangidos pelo regime da impugnação de normas todas as actuações administrativas desde que contenham pelo menos uma das características da generalidade e abstracção, quer adoptando-se a posição do Professor Doutor Alves Correia, que atribui ao plano urbanístico apenas a característica da generalidade e não da abstracção, quer a posição maioritária, estará sempre em causa o regime da impugnação de normas.
Resta acrescentar, que não me parece que seja de equacionar a posição de acordo com a qual o plano urbanístico seja um acto misto, pois mesmo que existam disposições no plano urbanístico que tanto podem assumir um carácter concreto, como abstracto, necessariamente uma dessas dimensões predominará e, adoptando o defendido pela doutrina maioritária, dominará o carácter abstracto, pois o plano será tido em conta sempre que em causa uma qualquer operação urbanística relativa a determinados imóveis, cujo conteúdo possível é imprevisível. Será igualmente de excluir o entendimento de acordo com o qual o plano urbanístico não pode ser reconduzido a nenhuma das categorias tradicionalmente usadas para classificar a actuação da administração, pois, ao contrário do que argumentam, o plano urbanístico é abstracto, pelo que não está impedida a sua aproximação ao regulamento, assim como não considero correcta a afirmação segundo a qual o plano urbanístico "não regula a situação do indivíduo em face da Administração e impõe uma ordem que ultrapassa o quadro dos interesses individuais"(2), pois a realidade demonstra que os planos determinam de modo decisivo o destino das pretensões dos particulares, principalmente quando em causa planos com eficácia plurisubjectiva, além de que qualquer actuação da administração nunca se poderá basear exclusivamente em interesses individuais.

Sara Lemos de Meneses
17543


(1) DUARTE DE ALMEIDA, CLAUDIO MONTEIRO, GONÇALO CAPITÃO, JORGE GONÇALVES, LUCIANO MARCOS, JORGE GOES, PEDRO SIZA VIEIRA, Legislação Fundamental de Direito do Urbanismo - Anotada e Comentada, Volume I, Lex, Lisboa, 1994, p. 148.
(2) ALVES CORREIA, Manual de Direito do Urbanismo, Volume I, Almedina, Coimbra, 2008, p.617.


Bibliografia


DUARTE DE ALMEIDA, CLAUDIO MONTEIRO, GONÇALO CAPITÃO, JORGE GONÇALVES, LUCIANO MARCOS, JORGE GOES, PEDRO SIZA VIEIRA, Legislação Fundamental de Direito do Urbanismo - Anotada e Comentada, Volume I, Lex, Lisboa, 1994.

VASCO PEREIRA DA SILVA, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise - Ensaio sobre as Acções no Novo Processo Administrativo, Almedina, Coimbra, 2009. 


ALVES CORREIA, Manual de Direito do Urbanismo, Volume I, Almedina, Coimbra, 2008.

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