domingo, 22 de maio de 2011


Impugnação de normas


         A impugnação de normas é uma acção administrativa especial regulada nos art.º72º a 77º CPTA, estando em causa o contencioso de impugnação das normas regulamentares emanadas no exercício da função administrativa.
         A referida impugnação é aplicável a todas as situações jurídicas gerais e abstractas ou que possuam apenas umas destas características. Ficam, assim de fora os actos materialmente administrativos individuais e concretos mesmo que inseridos em diplomas legislativos ou regulamentares.
         Antes da reforma, podemos distinguir três formas de reagir contenciosamente contra regulamentos administrativos: por meio de incidente, onde o regulamento era apreciado indirectamente como incidente da questão principal pois o que estaria em causa seria um recurso directo de anulação de um acto administrativo onde a ilegalidade era consequente da aplicação do regulamento inválido, e por isso resultaria a anulação do acto administrativo e a não aplicação do regulamento ao caso em concreto. Através de meio processual genérico com a declaração de ilegalidade de normas administrativas (Art.66º e ss LEPTA) contra qualquer norma regulamentar, independentemente de ser proveniente de um órgão ou de uma entidade mas teria que ser uma norma exequível por si mesma, ou de ter sido, já antes, julgada ilegal (a título incidental) em três casos concretos. Ou ainda, por meio processual especial de impugnação de normas (Art.63º e ss da LEPTA), contudo este meio tinha um âmbito de aplicação restrito porque apenas dizia respeito aos regulamentos provenientes da denominada administração local comum, mas não estava sujeito aos requisitos do meio anterior.
         Após a reforma podemos enumerar algumas alterações no regime de impugnação de normas: primeiro, e como refere Vasco Pereira da Silva[1], existe uma “uniformização do regime jurídico do contencioso regulamentar” e surgindo, deste modo uma “subespécie de acção administrativa especial, qualificada em razão do pedido de impugnação de normas jurídicas, para além de se manter a possibilidade de apreciação incidental de regulamentos, a propósito do pedido principal de anulação de actos administrativos, no âmbito da mesma acção especial”[2].
         Segundo, é fixado um estabelecimento de um regime uniforme (sendo o padrão modelo o regime processual genérico referido anteriormente) e três regras diferentes: a regra geral referente a todos os casos e independentemente de quem propõe a acção que impõe a existência de três casos concretos em que a aplicação tenha sido recusada por qualquer tribunal com fundamento na sua ilegalidade (Art.73º/1CPA. Uma segunda condição dirigida À acção pública, onde o Ministério Público pode pedir a declaração de ilegalidade mesmo que não se verifiquem os três casos concretos que permitem desaplicar a norma (Art.73º/3CPA), permitindo, assim, ao MP impugnar normas com eficácia imediata ou aquelas que dependam de acto administrativo em execução. A última regra fixada permite recorrer à acção para defesa de direitos, bem como à acção popular, quando está em causa uma norma imediatamente exequível, sem o julgamento em três casos, mas esta apenas produz efeitos no caso concreto (Art.73º/2 CPA).
         Em seguimento do que foi dito, Vasco Pereira da Silva[3], afirma que a lei confundiu a contraposição entre o particular, o actor popular e o actor público, pois apenas o MP será o particular responsável por impugnar normas regulamentares já que os dois primeiros estão condicionados à verificação dos três casos concretos julgados em recusa da aplicação da norma ilegal. Além do mais, é conferido ao actor popular mais poderes que ao particular lesado, podendo o primeiro solicitar a intervenção do MP e constituir-se como assistente, enquanto próprio lesado nem isso poderá fazer. Partilhando a linha de pensamento de Vasco Pereira da Silva[4], o legislador inverteu os papéis e tornou a actuação do assistente, que pode ser uma actuação supérflua, em preponderante por lhe conferir amplos poderes que o particular, sendo a sua actuação necessária. Assim, partilhando de uma interpretação correctiva, o Art.72º/3CPA deve ser alargado nos poderes e constituição como assistente ao particular, por razões de congruência de espírito do sistema e os interesses que estão em jogo.
         Ainda assim, podemos acrescentar que o tratamento desfavorável do particular implica uma objectividade na impugnação de normas, tendo em conta a natureza das normas jurídicas em causa. O que não se percebe é o esquecimento da subjectividade já que os regulamentos são “formas de actuação administrativa que podem produzir efeitos lesivos na esfera dos particulares, os quais quando se trate de uma norma exequível por si mesma, são idênticos aos produzidos por um acto administrativo”[5], mesmo assim o tratamento desfavorável vai contra a autonomização do direito fundamental de impugnação de normas jurídicas no disposto no Art.268º/5CRP).
         Concludentemente, podemos partir da criação da nova categoria de sentença de declaração de ilegalidade concreta de normas jurídicas gerais e/ou abstractas (Art.73º/2CPA) que a impugnação de normas apresenta apenas duas modalidades ou dois tipos de pedidos, como referem Vieira de Andrade[6]. Primeiro, o pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral e, segundo, o pedido de declaração de ilegalidade no caso concreto. Contudo, devemos de ter em conta que a norma jurídica ou é legal ou se for apreciada ilegal implica que deve vincular todos os destinatários e todas as situações de vida de modo a produzir o seu afastamento da ordem jurídica, assegurando a protecção plena dos titulares dos direitos legalmente protegidos em relação ao caso concreto, para além de que a declaração de ilegalidade, e nas palavras de Vieira de Andrade, é como uma questão predominantemente de interesse público[7]. Em sentido oposto, Vasco Pereira da Silva, defende que a impugnação de normas gerais e/ou abstractas que apenas tem efeitos concretos, cria uma restrição ao conteúdo, alcance e extensão do direito fundamental estabelecido no Art.268º/5CRP e protector das normas jurídicas lesivas dos direitos dos particulares, e por isso, deve-se considerar inconstitucional, não só mas também pela “violação de bens e valores constitucionais de natureza objectiva nomeadamente os princípios da legalidade (…), igualdade (…), e do Estado de Direito (…).”[8] Pois, admitiríamos, assim, que uma sentença de um tribunal possa declarar a ilegalidade de uma norma jurídica mas deixando-a subsistir na ordem jurídica relativamente a outros particulares (cria assim desigualdades em função dessa subsistência), pondo em causa, também, a unidade e coerência do sistema jurídico.
Pressupostos
         No que toca à legitimidade, se estivermos perante o actor popular e a acção pública então são impugnáveis todos os regulamentos sejam exequíveis ou não por si mesmo e tenha havido ou não prévia decisão judicial de não aplicação de três casos concretos (Art.73º/1 e 3 CPTA). Quanto à defesa de interesses próprios exige-se a recusa em três casos concretos por ilegalidade – Lesado – Art.73º/1CPTA, ou se disser respeito a um regulamento imediatamente exequível pode ser pedida a declaração de ilegalidade, mas esta apenas produz efeitos concretos (Art.73º/2CPTA).
         Além do mais, ressalva-se o facto de ser possível impugnar um interesse actual ou futuro (Art.73º/1CPTA), e a possibilidade de a declaração de ilegalidade ser solicitada a todo o tempo por não se encontrar sujeito a prazo (Art.74ºCPTA).




[1] Vasco Pereira da Silva, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, Almedina, 2005
[2] Vasco Pereira da Silva, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, Almedina, 2005
[3] Vasco Pereira da Silva, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, Almedina, 2005
[4] Vasco Pereira da Silva, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, Almedina, 2005
[5] Vasco Pereira da Silva, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, Almedina, 2005
[6] Andrade, José Carlos Vieira, “A justiça Administrativa”, Almedina, 2004
[7] Andrade, José Carlos Vieira, “A justiça Administrativa”, Almedina, 2004
[8] Vasco Pereira da Silva, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, Almedina, 2005


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Ana Isabel Santos de Menezes, nº17140, subturma3

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