sábado, 26 de março de 2011

Tarefas

Tal como indicado pela Drª Mafalda Carmona aqui ficam as primeiras tarefas:

Comente as seguintes afirmações:
1) "Julgar a Administração é ainda administrar."
2) "Admitir que um tribunal condene a Administração seria a violação do princípio de separação de poderes."
3) "Os tribunais administrativos são os tribunais comuns da função administrativa."

quinta-feira, 24 de março de 2011

Relação entre procedimento administrativo e processo contencioso administrativo

Considerando a doutrina em geral é possível reconduzir o relacionamento entre estas duas figuras a três modelos. São eles:

- Modelo de separação ente procedimento e processo;
-Modelo de alternatividade do procedimento relativamente ao processo;
-Modelo de complementaridade entre procedimento e processo.

Relativamente ao primeiro modelo de relacionamento apresentado é certo que corresponde a um entendimento clássico do Direito administrativo. Nas palavras de NIGRO “ entre procedimento e processo não existem semelhanças nem pontos de contacto”, sendo claramente distinto o mundo do procedimento, o mundo do acto acto administrativo e do exercício do poder administrativo através do acto daquele que é mundo da tutela jurisdicional. É possível encontrar neste modelo resquícios dos circunstancialismos históricos de Direito administrativo do sistema tipo francês, o que leva grande parte da doutrina francesa a ignorar a autonomia dos dois fenómenos, entendendo mesmo que “ o procedimento não é relevante senão na medida em que se traduz num acto administrativo e que portanto somente o acto e o contencioso administrativo possuem “dignidade dogmática” .”

Já o segundo modelo entende o procedimento administrativo como uma alternativa ao processo contencioso. O procedimento administrativo adquire aqui uma estrutura para-judicial e uma função jurisdicional que o assimilam à tutela jurisdicional e o fazem dela concorrente, existindo mesmo quem tivesse ido mais longe (NIGRO) e classificasse esta alternatividade como recíproca e que não é deixada à escolha dos particulares, mas cuja escolha cabe ao legislador e ao sistema normativo no seu conjunto.
Porém este modelo, para além de, fugir do modelo inicialmente apresentado como sendo de alternatividade do procedimento relativamente ao processo é alvo de críticas pela doutrina (VASCO PEREIRA DA SILVA) pois parece carecer de rigor lógico. “ A junção num único modelo da alternatividade do procedimento em relação ao processo carece de rigor lógico. Pois, uma coisa é entender o procedimento administrativo como um sucedâneo do controlo contencioso, regulamentando-o de forma a compensar as insuficiências de um limitado processo de controlo dos actos da Administração, outra coisa é considerar que o processo contencioso deve ser entendido como alternativo do procedimento administrativo. O que aliás tanto poderá corresponder à defesa de um modelo de separação , no caso da preferência pelo contencioso administrativo implicar a não consideração autónoma do procedimento e, consequentemente, a ausência da sua regulamentação legal, como a um modelo de complementaridade (com primado do processo) se o privilegiar do processo contencioso não significar o desconhecimento da relevância das questões procedimentais, mas tão só o considerar que a intervenção do juiz administrativo constitui a melhor forma de protecção dos direitos dos particulares.”
Parece então que só nesta medida se pode falar em alternatividade (uma alternatividade do procedimento relativamente ao processo) que se caracteriza por uma visão do procedimento como instrumento de resolução de conflitos de interesses, antecipando-se e substituindo-se ao processo contencioso (admitido em termos limitados). Para esta concepção o centro da gravidade da protecção jurídica do cidadão contra a Administração Pública é o procedimento administrativo e o controlo jurisdicional é totalmente posterior, formal, externo. ( realização da justiça através da Administração) A este modelo correspondem os direitos austríaco e norte-americano.

Distinto destes dois modelos expostos (supra) é a perspectiva de complementaridade que corresponde a um “modelo de relações entre procedimento administrativo e processo jurisdicional. Dentro desta ideia distinguem-se ainda dois sub-modelos:

- Complementaridade com primado do processo contencioso (concepção alemã);

-Complementaridade com primado do procedimento (concepção italiana).

No Direito alemão a função de protecção jurídica deve continuar a pertencer em primeira linha ao processo contencioso, cabendo ao procedimento um papel coadjuvante na realização desse objectivo, ao permitir ao privado , a defesa antecipada de direitos e, à Administração, o conhecimento e o respeito pelos diferentes interesses em presença , sendo ainda de maior importância nas situações em que o controlo jurisdicional se encontra por natureza limitado (v.g domínio da discricionariedade, das decisões plano e de procedimentos de massa).
Esta mudança de paradigma levou a um acréscimo da protecção subjectivista que se entende poder ser realizada pela via procedimental ,mas que vai levar a uma maior formalização do procedimento ( BETTERMANN) . Esta antecipação da protecção jurídica através do procedimento faz com este tenha uma importante função de protecção jurídica, nomeadamente “em todas aquelas situações em que se afigura inevitável a existência de um deficit de regulação material, fazendo diminuir consequentemente, a intensidade da apreciação jurisdicional. Nestas situações , cada vez mais frequentes na moderna Administração , o procedimento administrativo permite ir além do controlo contencioso, fornecendo uma certa compensação para a limitada protecção jurídica oferecida pelos tribunais administrativos no domínio do poder discricionário. “(ERICHSEN)
Mas também aqui o procedimento não se substitui ao processo , nem constitui uma alternativa ao controlo pelo tribunal, uma vez que é sempre de admitir no âmbito do controlo do vínculo da competência, fim e princípios como o da imparcialidade e proporcionalidade, surgindo antes como uma expansão da protecção jurídica subjectiva em aspectos em que a apreciação jurisdicional não poderia ser integral.

No que toca ao modelo italiano , este assenta deste logo na convicção de que se o processo judicial não assegura plenamente a justiça ,isso deve ser compensado com a procedimentalização da actividade administrativa, sendo esta uma via adequada (TRIMARCHI). Contra esta perspectiva poder-se-ia alegar (VASCO PEREIRA DA SILVA) que uma tal realização da justiça pela via do procedimento seria incompatível com as normas constitucionais consagradoras de um controlo jurisdicional efectivo da Administração. Porém para a doutrina italiana este seria um falso problema ,uma vez que, a criação de uma “Administração do tipo judicial” representaria a possibilidade de configurar uma tutela administrativa original, sem obviamente atentar, mas sim potenciar a garantia da jurisdição. ( CHITI) Não se pode contudo levar tão longe a ideia de preferência pelo procedimento que leve à defesa de ideias de continuidade entre procedimento e processo. Este extremismo objectivista é de rejeitar.

Qual o modelo seguido no direito português?
Parece ser de afastar tanto o modelo de separação como o da alternatividade entre procedimento e processo.
No nosso sistema o procedimento e processo são realidades orgânica, formal e materialmente diferenciadas, visto que correspondem ao exercício de funções estaduais distintas:

- Título V “ Tribunais”–arts. 203º ss CRP -constituem institutos juridicamente “separados”

- Título IX “ Administração Pública”- arts. 266º ss CRP

- arts. 17º, 267º nº5 e 268º nº 4 e 5 CRP - ambos os institutos são regulados ,na nossa ordem jurídica, como instrumentos de complementares de garantia de protecção jurídica subjectiva que resulta do facto das normas constitucionais que lhes dizem respeito terem a natureza de direitos fundamentais.
Para além da previsão constitucional, este ideia encontra-se subjacente em todo o ordenamento jurídico. Exemplos:
- art. 12º CPA;
-art.109º CPA;
-art.46º LPTA
-art. 82º LPTA (…)
A missão do procedimento administrativo não é a de substituir-se à justiça administrativa mas avançar nos domínios vedados aos tribunais (VASCO PEREIRA DA SILVA) e seria sempre necessário (ROGÉRIO SOARES) para manter o equilíbrio entre as prerrogativas do poder público e os interesses dos particulares, sendo necessário recorrer a um terceiro poder imparcial. Contudo o que importa reter é que apesar de estruturalmente diferentes, processo e procedimento, este ainda desempenha uma função de protecção jurídica subjectiva.

VASCO PEREIRA DA SILVA, Em busca do acto administrativo perdido –“ o Procedimento administrativo como alternativa ao acto administrativo”, vol III , 1995 ,Lisboa
VASCO PEREIRA DA SILVA, Para um contencioso administrativo dos particulares, Almedina, 1989, Lisboa